sexta-feira, 28 de novembro de 2014

do não ao sim

o sonho
o pesadelo

a euforia
a depressão

eu vou?
eu não!

a esperança
o desespero

a atitude
a prisão

a força
o medo

o caos
destruição

eu vou!
eu não.

eu sou
maior e menor
que a minha
percepção

atravesso meu
deserto

a certeza
a ilusão

os opostos
os extremos

correm de uma
à outra mão

eu não?
eu vou.

queixo erguido
peito aberto

em galope
o coração

sigo o fluxo
quente e vivo
da minha própria
criação

eu não
em vão
eu vou
eu sim

e fim

encosto

toco o fundo
do poço
eu não disfarço:
roo o osso

não escondo
o ódio
o peso
o desgosto

não finjo
mais aquele
sorisso insosso

não pinto
felicidade falsa
no meu rosto

não compro
ou vendo
ilusões
a contra gosto

o deus posto?
o belo imposto?

ainda tiro
das minhas costas
este enconsto






segunda-feira, 17 de novembro de 2014

passarinhas

me deram silêncio
como castigo
e então eu fiz dele
meu guia

eis do que foram
e são
privadas
as mulheres
que morreram
ou morrerão
sem
aprender
a ler e a escrever

percebe?
sente?

elas são impedidas
de transformar o
castigo
em luta

elas são condenadas
à mãe ou
à puta

e a terceira opção
seria qualquer coisa
como a morte

isso se elas
tiverem sorte

ou seriam
lentamente
assassinadas
doloridamente
dia após dia

estupradas
magoadas
apavoradas

por quem?

quantos séculos
depois
nós aqui
lendo
umas às outras

é ou não é
um privilégio
de poucas
que precisa ser
de todas?

que o silêncio se
transforme em
palavra
escrita

eis-me:
a guia
de minha própria
consciência

vocês,
minhas companheiras

às turistas,
boa estadia!
às passageiras,
apertem os cintos!
machos: calados.

vamos
passarinhas
passeando
pelo ar

ainda que
com medo
de um tiro
nos levar
ao chão

terça-feira, 11 de novembro de 2014

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

clássica

eu queria parar
a música
do apartamento
de cima

clássica
piano
calma
branca

era uma música de paz
tocava ao fundo
do centro espírita
que eu frequentava

eu queria parar a música
ela me lembra
da minha necessidade
de ser salva
e de salvar

do homem que me pediu
para que eu fechasse
os olhos
e que me tocou
sem eu saber se aquilo
era carinho
ou se era ele
tirando a maldade
do meu corpo
com suas mãos
bondosas

acho que vou vomitar

não
vou tomar um banho
me sinto encardida
pela religião que tive

pálida
bélica
fálica
travestida
de verdade

a grande mentira
em volta da qual
girava
minha vida

o pássaro e a noite

sentimentos são como
o pássaro que
não soltei
aos sete anos
de idade
por temer
que fosse maldade

me arrependi
amargamente

o homem que prendia
aquele canto
tentou envenenar
minha cachorra
com chumbinho

hélio era seu nome
não esqueço
morava na casa dos fundos

ele tinha o sorriso
idiota
do roberto carlos
rei de sei lá o quê
e estava sempre
com pressa

"são tantas emoções, bicho"
era disso a cara que ele tinha
mas de que emoções
é que ele entendia?

eu poderia ter pulado
o muro
e ter aberto
a gaiola

eu poderia?
talvez eu apanharia
e eu tinha sete anos
de idade:
eu não podia

o pássaro
que não soltei
quando pequena
esperou meu peito
se abrir

hoje, adulto
saiu batendo as asas
com uma força
que já sabia guardar
dentro de si

e beijou a noite
escandalosamente
pousado sobre a cruz
da igreja

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

pássaro preto

já amei o branco
da pomba da paz
não mais

já não amo
pacificamente
o mundo
como há meses
atrás

mas ainda amo
talvez não mais o mundo
e sim gaia

permito a raiva
e todos os contraditórios
não amo pelos aplausos
do auditório

amo pelo abandono
da menina abraçada
aos seus joelhos roxos
morta de sono

amo pelas lágrimas
guardadas durante anos
volume morto
envenenado
com pesados metais

ais!

pelo
buraco negro
no peito
que nos sugavam
sabe-se lá para onde
enquanto no quarto
com as luzes apagadas
lavávamos os travesseiros
engolindo o soluço
mudo
pra ninguém desconfiar

pelo medo
de termos pecado
antes de dormir

pelo desejo de
sonhar
com um espaço
onde fosse
permitido chorar
sem prender o ar

pássaro preto
riscando o céu
à noite

invisível
entre as estrelas

depois
de deixar a gaiola

eis o meu amor