sexta-feira, 23 de abril de 2010

margianal

margianal

pra quem fica à margem
desse prazer

                                voyeur

terça-feira, 20 de abril de 2010

versos comprimidos

para didoneante 

engulo com vontade
comprimidos sintéticos
feitos de loucuras
                                  sintáticas

sexta-feira, 16 de abril de 2010

pudor

o senhor é meu penhor
e nada me faltará

meio

não há meio
de ser
sempre inteiro?

sentença

ausência
minha partida
sua sentença

ébria

eu absinto
uma ponte
sobre o abismo
entre nós

o cio do ócio

o ócio
sozinho
é um saco
acompanhado
 é pau
no buraco

calcinha

minha calcinha sua
só com umolhadinha
sua

silêncio

sua língua
míngua
a minha

um caso de amor e de ódio

palavra I – amor

a palavra é o grito que representa uma coisa que é muda e que jamais pode ou poderá ser representada, a coisa: esse é o maior sofrimento do poeta: dar som àquilo que nunca deixará de ser silêncio. poeta é o que trabalha com a matéria do impossível. poeta é aquele que veste o que nunca deixará de estar nu. o poeta é a própria nudez em forma de carne. sua palavra é suor e soa alto. palavra é o tronco que ecoa oco, mas que esconde e mostra seu cerne.

todas as palavras já foram ditas.


palavra II – a ódio

todas as palavras - essas malditas – já foram inventadas e já estão ditas. quando nasci, não sabia falar. quando soube, não pude escolher a palavra chichume para designar uma coisa que é uma panela. não pude escolher a palavra crelho para designar uma coisa que é casa. não pude escolher a palavra zomburo para designar aquilo que conhecemos como loucura!

e tem gente que ainda acredita em liberdade. tolos.

faz meu gênero



a dor é crônica
por isso conto:
prefiro poema

autoria

minha assinatura
foi assassinada
silenciosamente
mas jaz em todos
os versos
                                 dispersos
em paz



quinta-feira, 15 de abril de 2010

Diálogo

- Conhece a Liberdade?
-Ah, sim, a filha da Ousadia com o Descaso?
- Não, a filha do Respeito e da Coragem. Essa daí que você falou até parece fisicamente com a Liberdade, mas o nome dela é Libertinagem. 

quarta-feira, 14 de abril de 2010

O grito de Sophia

Liberdade é uma palavra redonda, cheia, que quase explode na boca quando pronunciada em looping: li-ber-da-de-li-ber-da-de-li-ber-da-de-li-ber-da-de. É um grito alto que alivia quando não está mais preso na garganta. A liberdade sobe das vísceras com uma força descomunal, atropelando coração, atropelando o fôlego. Eu não preciso de pão. Alimento para o meu corpo é liberdade. Em looping, assim: ...-li-ber-da-de-...!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

O poema

Nenhum poema
Merece respeito
Todos são trouxas
Feito nas coxas
Todos são leigos
 
Nenhum poema
Nasce direito
-Cortam a alma
Rasgam a calma
Mostram defeitos
 
Nenhum poema
Fala baixo
Grita pouco
Revela o intento
 
Mas quando o poema
Endoidece a face
Desfaz o disfarce
Insulta o certo
Alça vôo e se lança
 
Tudo de oculto
em mim
Se alcança

perfeição

o poema perfeito
acontece
não é feito

pegadas

me faça
perder
as estribeiras
me amassa
me encaixa
me deixa
sem eira
nem beira

me come
pelas beiradas
ou então some
sem deixar
pegadas

circus

meu nome
um endereço
na tua agenda
de homem

na minha
um embaraço
qualquer
um “quem sabe?”
de mulher

aparece fazendo
estardalhaço

some
me levando
um pedaço

tanto faz
cansei do meu nariz
de palhaço

linguagem

sinta-se à vontade
entre meu sexo
e minha sintaxe

contemplação


religião
contemplo
sem templo
nem instituição

quarta-feira, 7 de abril de 2010

descobertas


perplexa
até debaixo
das cobertas
você me
descobre
                 complexa

inventador


invento uma dor
para desbaratinar
a minha
crio e creio
assim nunca
estou sozinha

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Escrituras sangradas

Quando olhares para o céu, abóbada azul, lembra-te: és nuvem que passa e logo em breve tu te dissiparás. E ao apertares os olhos sentido a dor feminina de rasgar o ventre em vermelho, lembra-te que é dele que são feitas tuas estranhas entranhas de mulher. E se por acaso teu útero contrair, não permitas tu que teu grito mudo delate tua íntima dor. Já aprendeste o caminho do silêncio, segue por ele. Segue sangrando por este caminho solitário e seco. Teu coração ainda bate quente no silêncio seco e espesso do deserto. Para onde vais? Para onde fores. Para quem gritarás? Socorro, para a voz que mora na tua própria cabeça. E quem responderá? Necessário que saibas: ninguém. Tuas pernas são tuas últimas companhias e teus olhos, a única esperança. Para além do que tu não podes ver, existe o que tu ainda não enxergas. Anda. Atravessa o deserto que há em ti, o deserto de mar morto que sangra aí dentro. Atravessa com sede, fome e medo, nem ao menos a ilusão do oásis à tua frente. Anda, atravessa teu deserto íntimo e universal de mulher. Tu mesma te esperas do outro lado do deserto. Altiva e outra.