sexta-feira, 2 de abril de 2010
Escrituras sangradas
Quando olhares para o céu, abóbada azul, lembra-te: és nuvem que passa e logo em breve tu te dissiparás. E ao apertares os olhos sentido a dor feminina de rasgar o ventre em vermelho, lembra-te que é dele que são feitas tuas estranhas entranhas de mulher. E se por acaso teu útero contrair, não permitas tu que teu grito mudo delate tua íntima dor. Já aprendeste o caminho do silêncio, segue por ele. Segue sangrando por este caminho solitário e seco. Teu coração ainda bate quente no silêncio seco e espesso do deserto. Para onde vais? Para onde fores. Para quem gritarás? Socorro, para a voz que mora na tua própria cabeça. E quem responderá? Necessário que saibas: ninguém. Tuas pernas são tuas últimas companhias e teus olhos, a única esperança. Para além do que tu não podes ver, existe o que tu ainda não enxergas. Anda. Atravessa o deserto que há em ti, o deserto de mar morto que sangra aí dentro. Atravessa com sede, fome e medo, nem ao menos a ilusão do oásis à tua frente. Anda, atravessa teu deserto íntimo e universal de mulher. Tu mesma te esperas do outro lado do deserto. Altiva e outra.
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Dá medo. Dá muito medo dar o primeiro passo.
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