clitóris
foi feito
pra gozar
boca
foi feita
pra falar
sim ou
NÃO
foi feito
pra respeitar
braço pra
socar
perna pra
chutar
coração
pra dançar
e olhos
pra encontrar
mira:
é pegar
ou largar
clitóris
foi feito
pra gozar
boca
foi feita
pra falar
sim ou
NÃO
foi feito
pra respeitar
braço pra
socar
perna pra
chutar
coração
pra dançar
e olhos
pra encontrar
mira:
é pegar
ou largar
meus quadris
paralisados pelo
ritmo do homem
revelavam
a censura
dos prazeres
cíclicos
as bordas
do meu corpo
orbitando
um ponto
imóvel
obstruído
pelo poder
cartesiano
linear
e fálico
revelavam
que eu não
podia
obedecer
minha própria
intimidade
que eu
só servia
pra servir
e quando
o corpo revoltado
decidiu que
o ritmo interno
seria mestre e
guia
foi a minha
sanidade
que ele decidiu
que controlaria
para seu azar
eu aprendi
a rebolar
longe de seu
alcance
Para Taynara Bruni
não faz
muito tempo
que te conheço
mas
parece
que sua
gargalhada
tem cem anos
e é capaz
de acordar a noite
acendendo estrelas
no meu peito
parece que
a tua dor
tem mil anos
é mais velha
que seu sorriso
como queria poder
fazer algo
sobre isso
além de
estar aqui
mas não posso:
estar aqui é o jeito
parece que a
tua raiva é nova
eu só quero
que ela cresça
porque raiva cura
quero que você
fique segura
floresça
que não se puna
que soque
grite
chute
as pessoas certas
não a si mesma
faça e aconteça
me usa de saco
de pancadas
juro que não
dá nada
só risada
quero minha boca
estalando beijos
nessa bochecha
macia
e teus ouvidos
sendo atingidos
pela palavra miga
miga miga
me escuta
siga sua sina
de mulher
fotógrafa
desenhista
& resista:
você é artista
adianta balançar
a cabeça não
não fiz uma pergunta
foi afirmação
quero que
você olhe
no espelho
e diante do
reflexo
mais veja
do que reflita
veja veja
como essa
mulher é
bonita
quero um dia
te ouvir dizendo
que suas memórias
latejam
mas só às vezes
não que doem
sempre
depois que
agora você
é feliz
que só ficou
a cicatriz
"tô suave"
voe, amiga
livre viva
você é ave
enquanto o dia
não chegar
- não tenha pressa
porque a pressa
em mandar memórias
embora
faze a dor teimosa
querer ficar -
eu vou afirmar
numa ou noutra
melodia:
taynara
não para
de ser
essa poesia
acho que escrevi
o que queria
pra te arrancar
um sorriso
que mais que eu faço?
já sei
vem aqui
e me dá
um abraço
será que você
gostou do modo
com que minha língua
tocou a sua
será que você gostou
do meu gosto
será que achou
minhas piadas
de mau gosto
será que amanhã
vai esquecer do
meu rosto
será que eu fui
só mais uma
nua que conheceu
sua rua
seu travesseiro
que tomou banho
no seu banheiro
ou será que fui aquela
que não passa
permanece
como pulga na orelha
bem pentelha
quem sabe você cresce
será que eu deveria
ter sido rude
quando você
me pediu nudes
quem sou eu
pra você
e quem são elas
será que é raso assim
o seu mundo
ou será só medo
de ir tão fundo
será que quando você
olhou nos meus olhos
você viu a minha dor
será que você acha
que eu me faço
de vítima
pra fingir
sofrer por amor
será que
por ser delicada
você achou
que não tenho pegada
será que por
não gostar de violência
meu jeito de transar
te deixou
entendiada
será que você
vai ler esse poema
será que será
sempre assim
o lema
não ter em mãos
o leme
navegar no desconhecido
com medo de naufragar
será que vai ser sempre
esse treme treme
será que sou muito
devagar
será que te incomoda
meu divagar
será que eu tô viajando
será que a deusa
tá no comando
como é que se manda
a cabeça parar
de pensar
me diga como não
ficar sem ar
será que vale
a pena
sonhar
em nunca mais
se machucar
será que vai me entender
vai tentar se justificar
ou quando eu quebrar
o silêncio
vai me repudiar
onde será
que nós vamos parar
quero o meu corpo
despido do desejo
sem medo da força
quero o meu corpo
e todas suas memórias
tocadas com suavidade
isto não é romantismo, tonta
tolice sua me achar romântica
por ousar querer o que mereço
carinho
cumplicidade
cuidado
menos do que isso
não é vínculo
é adereço
nunca entendi
o barato
dessa droga: status
a imagem sequestra
sentidos
fatos consumados
atos de consumo
bucetas commodities*
tudo errado
neoliberalismo
domando afetos
não tem jeito
insubmissa rejeito
relações: delas
não procuro definições
como "para sempre"
festa de casamento
cafonices heterossexuais
procuro, antes, a matéria
das vozes que se alternam
atingindo os tímpanos
percorrendo nossos cérebros
produzindo sentido
sustentado por
palavras
mãos
bocas
nucas
coxas
seios
vulvas
lábios
línguas
cheiros
gostos
analiso o discurso
dos nossos movimentos
mesmo que a boca esteja
calada
o ruidoso silêncio
quebrado
a rede que se forma
ligando um silêncio
no outro
nós
da
realidade
não desconfiar
procuro a matéria da delícia
de gozar e fazer gozar
procuro a matéria
de uma vida autoral
fora das leis dos homens
e não aceito nada
pela metade
meia é de colocar
no pé
ou vem inteira
ou marcha-ré
*commodities é um jargão do marketing e significa mercadorias